A TEMÁTICA DO TEMPO NA POESIA MODERNA
Tenho escrito essencialmente poemas para o futuro. Ainda que o seu corpo os remeta para um tempo passado, ainda que as palavras pareçam exorcizar fantasmas do passado. Em bom rigor não existem poemas do passado. No preciso momento em que se escreve só há presente e futuro. É esta a escolha natural pela qual o poeta se bate. Não falaria em opção, uma vez que não me parece que um poeta, um dos verdadeiros, tenha opções quanto ao que escreve. É sim um seguir um caminho que emerge do próprio poeta. É como olhar. Pode-se olhar ao perto, ao longe, para os lados. Pouco sentido faz falar em opções do olhar. A poesia, como a concebo, é um submundo da natureza, um submundo que oscila entre pólos e que é posto a girar em virtude de situações acidentais e defeitos do ser humano. Só um poema para o futuro pode alterar o que quer que seja. Aplica-se aqui o que disse em relação a Herberto Helder. A questão do reviver e já não do reproduzir. É que este reviver é um viver actualizado, com os condimentos da ficção resfriadora do intervalo que passou, com a distância que permite ver melhor. O poeta, se quiser mudar (o seu) mundo, deverá assumir os riscos desse distanciamento, dispor das palavras como peças num jogo de xadrez, até à última palavra, à última peça. E assim será fazendo previsões, o que não é mais do que imaginar imagens e dispará-las num tempo sem finitude, criar ampliações, diminuições de fenómenos do interior, retirar utilidade às coisas, humanizá-las, como faz Manoel de Barros. Bem se sabe que a missão não se assegura fácil. E por isso mesmo é que, quando acontece, é mágico e é poesia, não oferecendo equívocos na qualificação.
Sylvia Beirute
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Fiquei sem palavras, Sylvia. Mais um destes escritos que dizem a quem pouco disse. Obrigado por nos oferecer isto. Abraços.
ResponderEliminarP.S: Peço permissão para colocar o link desta postagem em meu blog. Os interessantes e interessados devem ter contato com este texto lucífero.