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segunda-feira, 6 de setembro de 2010

ALEJANDRA PIZARNIK: POEMAS, POESIA, BIOGRAFIA

























sb: série poetas

ALEJANDRA PIZARNIK

nasci tanto / e  duplamente sofri / na memória daqui e de lá
                                                                                  Alejandra Pizarnik

Escrever sobre poetas de culto assemelha-se a olhar o movimento dos factos sem ver o corpo. Esse corpo, semi ou quase na totalidade oculto, dá lugar a um corpo imaginário que emerge na leitura, o mesmo que enche ou esvazia, que procura ou acha, confundido que está com os nossos próprios olhos. De facto, costumo fazer uma associação entre culto e cultivo: no sentido em que estes poetas de culto cultivam o seu mistério ao permitirem que outros também cultivem a parte que falta, aquela que a imaginação de cada um semeará e colherá. Com os poetas mortos esse culto é imposto pelo tempo, sobretudo se o tempo em que viveram não permitiu conservar muito coisa do lado pessoal e humano de quem escreveu. A chave é, pois, quanto menos se souber maior o mistério, e quanto maior for este, maior dimensão a obra adquire. Esse culto, acrescendo ao que disse, também recebe um incremento se a história que fica, mesmo que pouca, tenha alguma substância. Veja-se o caso das poetas Sylvia Plath e Florbela Espanca. A sua morte suicida acaba por ser indossociável da leitura do resto. Depois há aqueles poetas que usam de um lado genuíno neste "cultivo do culto", como é o caso, por exemplo, dos poetas portugueses Al Berto e Herberto Helder, o primeiro tendo manifestado elementos de um duplo culto: pela vida que levou e pela sua morte. Do mesmo modo, Daniel Faria também é um exemplo que merece atenção. A sua curta vida, também tragicamente ceifada, aliado a um quotidiano religioso, fizeram acontecer esse culto, no fundo esse preenchimento de omissões por um leitor  que até se torna mais fiel. Por outro lado, e na linha do que digo (que é uma linha de distanciamento entre poeta e leitor) há o caso dos poetas estrangeiros, aqueles que são mais apreciados noutro país do que no seu país de origem, situação que, como se vê, vem beber de alguns argumentos anteriores.

Em todo o caso, são eles, de uma forma ou de outra, poetas de culto; são eles que, sobrepondo (mais no sentido de a adicionarem) a sua parte vazia e oculta ao corpo do leitor, se confudem com ele, dão-lhe uma liberdade que se projecta na leitura criativa, ajudam a manter pacificamente (ou não) as questões em aberto. E isto traz conforto, assim como uma estranha forma de autenticidade, e um lado sugestionável por parte de quem lê e admira.

Esta pequena introdução, que poderia muito bem servir de introdução a outros poetas (Cesare Pavese, Paul Celan, Theodore Roethke, etc) leva-me a uma poeta argentina pela qual tenho muita estima: Alejandra Pizarnik. 

Alejandra Pizarnik (1936-1972) nasceu em Buenos Aires, Argentina, e é considerada uma das principais vozes da poesia argentina, unindo um lado lírico a outro surrealista. A poesia da poeta (prefiro-o ao vocábulo "poetisa", perdoem-me os puristas ser a minha escola, nesta matéria, a de Sophia de Mello Breyner Andresen) contempla o instante ainda enquanto abstracção do tempo, enquanto medo fraco de energia, olhos que se ausentam para não ver os pormenores da abdicação, o caminho para uma casa onde não se quer estar. O seu mundo poético é, dentro da substância que o move, um mundo em convulsão, uma convulsão esteticamente a fim da sensibilidade, das sensações que se elevam a outras, de modo a tocarem as dúvidas da existência, quando não o lado científico das coisas. Em Pizarnik há por vezes um cantar do silêncio, da depressão das pequenas consequências do dia-a-dia, do lado externo dos fundamentos da fé. Esta quebra de fé está muito presente na sua poesia, um sofrimento atroz que os poemas eivam de simbolismo, de surreal (ou surrealismo), havendo, com o auxílio deste último aspecto, uma espécie de ordem da angústia, uma arrumação das emoções, sempre uma última página da razão que impede a catástrofe. Alejandra Pizarnik faleceu em 1972 em consequência de uma profunda depressão.


A JAULA

Lá fora faz sol.
Não é mais que um sol
mas os homens olham-no
e depois cantam.

Eu não sei do sol.
Sei a melodia do anjo
e o sermão quente
do último vento.
Sei gritar até a aurora
quando a morte pousa nua
em minha sombra.

Choro debaixo do meu nome.
Aceno lenços na noite
e barcos sedentos de realidade
dançam comigo.
Oculto cravos
para escarnecer meus sonhos enfermos.

Lá fora faz sol.
Eu me visto de cinzas.


LA JAULA

Afuera hay sol.
No es más que un sol
pero los hombres lo miran
y después cantan.

Yo no sé del sol.
Yo sé la melodía del ángel
y el sermón caliente
del último viento.
Sé gritar hasta el alba
cuando la muerte se posa desnuda
en mi sombra.

Yo lloro debajo de mi nombre.
Yo agito pañuelos en la noche y barcos sedientos de realidad
bailan conmigo.
Yo oculto clavos
para escarnecer a mis sueños enfermos.

Afuera hay sol.
Yo me visto de cenizas.


Alejandra Pizarnik
tradução de Virna Teixeira

*

OS PASSOS PERDIDOS

Antes foi uma luz
na minha linguagem nascida
a poucos passos do amor.

Noite aberta. Noite presença.


LOS PASOS PERDIDOS

Antes fue una luz
en mi lenguaje nacido
a pocos pasos del amor.

Noche abierta. Noche presencia.


Alejandra Pizarnik
tradução de Virna Teixeira

*

PARA LÁ DE QUALQUER ZONA PROIBIDA


para lá de qualquer zona proibida
há um espelho para a nossa triste transparência


MÁS ALLÁ DE CUALQUIER ZONA PROHIBIDA

más allá de cualquier zona prohibida
hay un espejo para nuestra triste transparencia

Alejandra Pizarnik
tradução de Alberto Augusto Miranda

*

(excerto)

Não,
as palavras
não fazem amor
fazem ausência
Se digo água, beberei?
Se digo pão, comerei?


no
las palabras
no hacen el amor
hacen la ausencia
si digo agua ¿beberé?
si digo pan ¿comeré?

Alejandra Pizarnik
(tradução de Pedro Calouste)

*



A sua obra inclui:

* La condesa sangrienta.
* La tierra más ajena.
* La última inocencia.
* Las aventuras perdidas.
* Otros poemas.
* Árbol de Diana.
* Los trabajos y las noches.
* Extracción de la piedra de locura.
* El infierno musical.
* Poemas no recogidos en libros.

A poeta licenciou-se em Filosofia e Letras na Universidade de Buenos Aires e mais tarde interessou-se pela pintura, muito se devendo a Juan Batlle Planas. Passou por Paris onde, na Sorbonne, estudou Religião e Literatura Francesa. Nessa altura foi colaboradora de jornais e revistas literárias, escrevendo poemas e textos de crítica. Traduziu Antonin Artaud e Marguerite Duras, tendo estabelecido relações com Octavio Paz, Rosa Chacel, Julio Cortázar, entre outros.

Artigo escrito por Sylvia Beirute


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