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quarta-feira, 9 de março de 2011

ADRIENNE RICH: POEMAS

























O SONHO DE UMA LÍNGUA COMUM

VIII.

Consigo ver-me há anos em Sunion,
doendo-me de um pé infectado, Filoctetes,
em forma de mulher, coxeando o longo caminho,
deitada num promontório sobre o mar escuro,
olhando pelas rochas vermelhas até onde uma espiral silenciosa
de brancura me dizia que uma onda tinha rebentado,
imaginando a força daquela água lá das alturas,
sabendo que suicídio deliberado não era comigo,
mas o tempo todo cuidando, medindo aquela ferida.
Pois bem, tudo isso acabou. A mulher que prezava
o seu sofrimento está morta. Sou a sua descendente.
Amo o tecido cicatrizado que me legou,
mas quero partir daqui contigo
combatendo a tentação de fazer da dor uma carreira.

Adrienne Rich
em Uma Paciência Selvagem
Livros Cotovia
Tradução de Maria Ramalho e Mónica Andrade

*

O DESERTO COMO JARDIM DO PARAÍSO

8.

Que significaria pensar
que se é parte de uma geração
que tem simplesmente de passar?
Que significaria viver
no deserto, procurar viver
uma vida humana, algo
a transmitir aos filhos
para levar até à terra?
Que significaria pensar
que se nasceu acorrentado e que só o tempo,
nada do que se possa fazer
poder remir a escravidão
em que nasceu?

Adrienne Rich
em Uma Paciência Selvagem
Livros Cotovia
Tradução de Maria Ramalho e Mónica Andrade

*

TEMPO NORTE-AMERICANO II

Tudo o que escrevemos
Será usado contra nós
ou contra aqueles que amamos.
São estas as condições,
é pegar ou largar.
A poesia nunca teve hipótese
de se pôr fora da história.
Um verso dactilografado há vinte anos
pode ser escarrapachado a tinta na parede
para glorificar a arte como distanciamento
ou tortura daqueles que
não amamos mas também
não quisemos matar

Nós seguimos mas as nossas palavras ficam
tornam-se responsáveis
por mais do que tínhamos na intenção

e isto é privilégio verbal

Adrienne Rich
em Uma Paciência Selvagem
Livros Cotovia
Tradução de Maria Ramalho e Mónica Andrade



Adrienne Rich, Baltimore, Estados Unidos, 1929.
.

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