PRATO LIMPO
come-me sem nunca lavar as mãos primeiro,
não espero mãos puras, nem frias, mas quentes
e prende-me também a língua aos dentes
para que a ausência de palavras vença.
deves comer-me sem me lavar se quer
que a água desfaz o odor dos corpos,
roubando-lhes os sais que se trazem na pele
e que viciam até as almas mais hipotensas.
só regando com álcool é que vês crescer
a saciedade das feridas na boca por sarar,
se me faço de sal também acredito ser punhal
repete quando assim desejares mais sangue.
usa-me e não penses em poupar-me,
só o egoísmo te fará sempre prevalecer
porque é pensar-te outro que faz doer
e esquecendo-te de ti que nunca resistes.
no fim limpa os lábios à carne
feita de açúcar canela café e algodão
mas deixa o prato que se quer limpo,
levando contigo de volta impuras
as mãos soltas e para sempre tuas.
João Afonso Adamastor
lido no Allegro Allegorico
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