FLORENÇA-SIENA
Concerto para muros e ciprestes
numa escala de colina - não há fífias
na paisagem pós-divina da Toscânia.
As aves interpretam arabescos
concebidos pelo lápis de Da Vinci,
os rochedos de Ghiberti fazem vénias
à passagem do comboio, as oliveiras
e as faias são zincadas amiúde
por ferreiros eruditos, e o coro
feminino dos vinhedos, ensaiando
por Puccini, canta loas afinadas
ao engenho cenográfico do homem.
A morte, o imprevisto, o tremendismo
natural só comparecem, neste parque
do possível, como artistas convidados
(embora o Arno, às vezes, se amotine
em regressivas enxurradas de mau gosto,
enxovalhando as racionais disposições),
e até o próprio Deus, se quer entrar,
compra bilhete, aproveitando, de passagem,
para ver como se faz um paraíso.
José Miguel Silva
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