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terça-feira, 20 de julho de 2010

Um poema de Sylvia Beirute - Corpos Não Identificados


























CORPOS NÃO IDENTIFICADOS

amam-se os nossos corpos mortos.
amam-se num amor subterrâneo: os nossos corpos mortos.
amam-se os nossos corpos mortos num muro transparente
por onde vejo ainda: os nossos corpos mortos.
amam-se na ressonância do amanhecer que desperta
leve e docemente sobre a vitamina F que os seus cabelos
conservam: os nossos corpos mortos.
amam-se na respiração limpa dando caminho a uma
contemplação de cristais, a uma porta que ora:
os nossos corpos mortos.
amam-se no sonambulismo do primeiro acto, próximo
de uma prova contrária à sede que a nuvem rejeita:
os nossos corpos mortos.
amam-se numa súbita vontade que crucificou
a metamorfose do dia de hoje: os nossos corpos mortos.
amam a emulação palpável dos presentes na
cerimónia fúnebre: os nossos corpos mortos.
porque só depois do amor, descansa a morte.

Sylvia Beirute
inédito

3 comentários: