ESTIO AINDA
a mortalha sente fome e engole uma perna da mesa.
a sombra é o cepo onde entrego minhas coxas.
não andarei ao pó, não cuspirei sal pra ver barro.
prefiro amarrar junto os dedões e dar osso e sopa ao vermeiro triste
desse caminho.
esse caminho teve um dia um coração
que viera caber numa janela mexeriqueira
(e lá vai meu coro de caveira chifrada, e passa
osso e passa carniça
e passa urubu olhando minha preguiça)
esse caminho teve um dia uma valsa
que dançou molegoza de ventre e chinela.
(e lá vai meu coro de caveira chifrada, e passo
olho na desgraça e passa criança fantasma chorando farinha)
esse caminho nem sempre foi traição
já houve gente com lida boa de enxada.
(e lá vai meu coro de caveira chifrada, e passo raso
na pedra farelo e passa a vida pelo espinho da agulha quebrada)
*
PASTOS
bovinos paralelos bebem água;
bovinos sobrepostos dão rebanhos;
vacas contém casulos terneiros;
rente ao chão, são bois magoados;
presos, bois tem ângulos limitados.
vacas advertem novilhas;
opostos, somente os touros;
perpendicular ao bovino,
é a carne.
o pasto alimenta-se de bovinos
através da verdura.
*
Crescendo entre as costelas
das constelações -
entalados -
os meus desejos
perdem os traços
e os brotos
enquanto aguardam que eu caia para cima.
Duas noites e um varal de estrelas me condenaram.
Fugir é um brinco.
*
Com fome,
abro os zíperes
dos talhos nas pernas.
(Minha casa queima
por dentro
das paredes.
Está o segredo)
A geladeira aberta
a noite inteira
minha frieza é um pecado ecológico,
com medo do bicho
não consigo
parar de olhar
pro abraço congelado.
Entre as ervilhas,
o sorvete,
e o seu baço.
*
Francieli Spohr ou Fran ou Phrann ou Lia tem 26 anos e é só uma barqueira; não gosta de poesia mas não consegue livrar -se dela, prefere ler terror e é ali que pretende poetizar.
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