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sexta-feira, 15 de outubro de 2010

RAQUEL LANSEROS - POEMA - ENTÃO BEIJASTE-ME
























 A questão da profundidade na poesia é interessante. Precisamente porque não basta ser-se profundo. Quantos poemas profundos não se encontram por aí, mas que dizem, quase sem tirar nem pôr, o que outros disseram? Realmente o que (me) interessa é a capacidade de profundizar (prefiro esta palavra ao vulgar aprofundar, porque me parece mais exacta), furar pelo desconhecido, criar formas novas. Vem isto a propósito do poema que li de Raquel Lanseros (Jerez de La Frontera, Espanha, 1973). Vi nele o que infelizmente procuro e poucas vezes encontro: um desfilar de sensações e de imagens visuais, essa mistura de tacto com cérebro ou coração, e, last but not least, a elegância no discurso aliada a um sentido de Todo muito apurado, dando ao corpo poético cabeça, tronco e membros. A seguir.


ENTONCES ME BESASTE

Por celebrar el cuerpo, tan hecho de presente,
por estirar sus márgenes y unirlos al círculo infinito de la savia,
nos buscamos a tientas los contornos
para fundir la piel deshabitada con el rumor sagrado de la vida.

ú me miras colmado de cuanto forja el goce,
volcándome la sangre hacia el origen
y las ganas tomadas hasta el fondo.

No existe conjunción más verdadera
ni mayor claridad en la sustancia de que estamos creados.

Esta fusión bendita hecha de entrañas,
la arteria permanente de la estirpe.

Sólo quien ha besado sabe que es inmortal.

Raquel Lanseros


ENTÃO BEIJASTE-ME

No celebrar do corpo, tão feito de presente,
estirando as sua margens e unindo-as ao círculo infinito da seiva,
procuramos em tacteio nossos contornos
para fundir a pele desabitada com o rumor sagrado da vida.

Olhas-me pleno de tudo quanto o prazer forja
espargindo o meu sangue até à origem
assumindo minhas pulsões até ao fundo.

Não existe conjunção mais veraz
nem maior clarão na substância que nos cria.

Esta bendita fusão feita de entranhas,
a artéria permanente da estirpe.

Só quem beijou conhece a imortalidade.

Raquel Lanseros
Tradução de Alberto Augusto Miranda
lido aqui.

3 comentários:

  1. Fantástico, Lúcia!

    Que poema! De tirar o fôlego! Realmente aqui há profundidade em sentimentos e palavras. Raquel absteve-se dos "per-meios" Mergulhou fundo nas entranhas e imortalizou o beijo (amado) como um momento eterno.


    Maravilhoso!

    Beijos

    Mirze

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